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quarta-feira, 29 de março de 2023

GOLPE DE 1964 COMPLETA 59 ANOS * Frei Betto-SP

GOLPE DE 1964 COMPLETA 59 ANOS

 

-Passeata dos cem mil junho 1968-

Frei Betto

      Na sexta, 31 de março de 2023, o golpe que implantou 21 anos de ditadura militar no Brasil completa 59 anos. Na verdade, ocorreu a 1º de abril. Mas como nesta data se celebra o Dia da Mentira, os militares recuaram a comemoração para 31 de março. 


      A onda bolsonarista suscitou mobilizações favoráveis à volta da ditadura. A maioria dos que se opõem à democracia não têm ideia do que é um regime ditatorial: a censura que escondia da opinião pública as atrocidades praticadas nos porões do sistema repressivo; os reais índices econômicos do país; a corrupção que imperava nos sucessivos governos militares; as obras de arte proibidas; os assassinatos dos que lutavam por democracia.

      Fui preso duas vezes pela ditadura. A primeira, em junho de 1964, pelo “crime” de ser dirigente nacional da Juventude Estudantil Católica. Arrastado ao quartel da Marinha, no Rio, torturaram-me com socos e pontapés. Queriam que eu confessasse ser o Betinho (o mesmo que, mais tarde, liderou a luta contra a fome no Brasil ao criar a Ação da Cidadania), dirigente da Ação Popular, organização de esquerda de origem cristã. Ao se convencerem de que eu não era quem procuravam, queriam que eu denunciasse o paradeiro dele, ignorado por mim. Fiquei 15 dias detido, entre prisão da Ilha das Cobras e domiciliar. Não houve processo. 


      A segunda, que durou quatro anos, em 1969, por dar fuga a perseguidos políticos, atitude sacramentada pela Bíblia. Fiquei dois anos entre presos políticos e mais dois junto  a presos comuns. O STF reduziu minha pena de quatro para dois anos no mês em que eu completava os quatro... Isso se chama: ditadura! Como restituir minha vida nos dois anos que fiquei privado de liberdade? 


      Como disse Churchill, “ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Dizem que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos.” 


Correu muito sangue para resgatar a democracia brasileira após 21 de regime militar. Quem tem interesse em se informar, sugiro meus livros “Cartas da prisão” (Companhia das Letras), “Batismo de sangue” e “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira” (ambos da Rocco). 


      A TV Brasil, canal 2, exibirá, na quinta, 30/3, às 22h, o filme “Batismo de sangue”, dirigido por Helvécio Ratton. Acompanhe toda a programação de filmes da “Semana Ditadura e Democracia” na TV Brasil, de 27/3 a 31/3, sempre às 22h.

      Hoje, nossa frágil democracia é ameaçada pelos terroristas que, fanatizados pelo bolsonarismo, querem impor a lei da força sobre a força da lei. E pelos militares e civis que ainda insistem em negar que houve golpe em 1964 e adotam os eufemismos “revolução” e “movimento”. E, sobretudo, acreditam em fantasmas, pois até na farda do Corpo de Bombeiros enxergam comunismo...


      O governo Lula veio resgatar a democracia brasileira. Acima do partidarismo, somos todos chamados a aprimorá-la e evitar o retrocesso histórico que só beneficiará uma minoria privilegiada. E reinstalará o terror em nosso país.

 

Frei Betto é escritor, autor de “Tom vermelho do verde” (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org

Assine e receba todos os artigos do autor: mhgpal@gmail.com


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ENTREVISTA 
GUILHERME BALZA - UOL

Frei Betto é sempre lembrado quando o assunto é a controversa relação entre a ditadura militar e a Igreja Católica, que passava por profundas transformações enquanto o país esteve sob o jugo das Forças Armadas. Em entrevista ao UOL, o dominicano descreve os conflitos no interior da igreja durante a ditadura e explica como se operou a mudança de lado da CNBB, que inicialmente celebrou o golpe com agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida, mas depois se constituiu como força de resistência ao regime. O religioso revela ainda que a CIA (agência de inteligência dos Estados Unidos) financiou as Marchas da Família com Deus pela Liberdade, manifestações populares que antecederam o golpe m... 

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UOL - O que o senhor estava fazendo em 31 de março de 1964? Frei Betto - Na verdade o golpe foi no dia 1º. Essa história de 31 é invenção dos milicos porque tinham vergonha do 1º de abril. O golpe foi oficialmente no dia 1º de abril, quando Jango sai do Brasil e se refugia no Uruguai. Eu estava participando do Congresso Latino-americano de Estudantes em Belém, no Pará.... 

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UOL - Como o senhor recebeu a notícia? Frei Betto - A notícia veio de maneira difusa, confusa, de que havia movimento de tropas, que o Jango tinha passado por Brasília, depois ido a Porto Alegre e de lá saído ao Uruguai, porque estava deposto. O Congresso foi desfeito porque ali participavam estudantes de quase todos os países da América Latina, muitos deles acostumados a golpes militares. Eles sentiram que a coisa ia endurecer. Estava hospedado na casa do arcebispo de Belém dom Alberto Gaudêncio Ramos porque eu era dirigente da Juventude Estudantil Católica (JEC) e da Ação Católica também. Fui pra casa de um militante da JEC chamado Lauro Cordeiro. E ali fiquei, de ouvido colado ... 

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UOL - Como o Vaticano e o papa Paulo 6º se posicionavam? Frei Betto - O papa não se posicionou no início. Mais tarde, o Vaticano veio a censurar a ditadura. Porque com o tempo a repressão se estendeu também à igreja e daí criou-se não só uma divisão na igreja, mas a própria CNBB foi se afastando da ditadura. A partir dos anos 70 a CNBB foi praticamente a grande voz de defesa das vítimas da ditadura. Tanto que o mais importante documento sobre os mais de 20 anos de ditadura foi produzido pelo d. Paulo Evaristo Arns, que é o livro “Brasil Nunca Mais”, que ele fez também com o reverendo Jaime Wright. A igreja e a própria CNBB se tornaram, a partir do AI-5, uma voz contra a ditadura. A... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2014/03/20/cia-financiou-igreja-em-marchas-pro-golpe-diz-frei-betto.htm?cmpid=copiaecola

DADOS SOBRE FREI BETTO

Frade dominicano e escritor, Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, 69, mineiro de Belo Horizonte, era um jovem estudante adepto da Teologia da Libertação quando as tropas derrubaram o presidente João Goulart, em 1964. Foi preso pela primeira vez dois meses após o golpe, permanecendo 15 dias detido. O segundo cárcere foi mais longo, entre 1969 e 73, e mais cruel: o frade foi submetido a sessões torturas nos porões do DOI-Codi, em São Paulo, comandado pelo Coronel Brilhante Ustra. Nos dias posteriores ao golpe, o militante religioso foi testemunha da derrota dos progressistas no embate com conservadores dentro da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), fato que res... - 

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