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segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Do capitalismo utópico ao socialismo científico * Ademar Bogo

DO CAPITALISMO UTÓPICO AO SOCIALISMO CIENTÍFICO

Devemos a Friedrich Engels a formulação da tese denominada de “Socialismo científico”, explicação sobre a transição para o comunismo que Karl Marx fundamentou tão bem na crítica feita ao capitalismo, demonstrando que este modo de produção se encarregaria de produzir as contradições para a sua própria superação.

 

            Ao lançarem mão da ciência, Engels e Marx deram-se conta que o processo de superação do feudalismo ocorreu fundamentado no avanço das forças produtivas e na inovação das relações sociais, principalmente aquelas produzidas pelo sistema mercantil que não poderiam acontecer sem que houvesse uma classe apaixonada pela transformação radical da velha sociedade. A constatação de que, quando a Europa saiu da Idade Média, a classe média urbana era a força revolucionária existente. Ela vinha sendo criada ao logo do tempo e, aos poucos, a sua existência foi ficando incompatível com o regime feudal.

 

            Junto com a ascensão da burguesia, na modernidade, pelo menos a trezentos anos antes da revolução francesa de 1789, ressurgiu a ciência, a filosofia, a arte e a literatura que, cada uma a seu modo encarregaram-se de realizar o esclarecimento das visões ingênuas que vinham ainda dominadas pelos mitos do passado.

 

            O que a burguesia fez na Europa no período da transição, faz inveja a quem procura soluções para a apatia revolucionária dos tempos atuais. Sem deixar de fazer a disputa, no campo econômico contra a nobreza feudal, impondo, em meio à repressão militar e política as relações mercantis, Engels identificou três grandes batalhas que foram decisivas para enraizar o processo de avanço revolucionário: a reforma protestante incitada por Lutero que motivou duas grandes insurreições na Alemanha, em 1523 e em 1525; a segunda também como reforma protestante, foi liderada pelo francês João Calvino, que influenciou a partir de 1535 a criação de movimentos insurrecionais na Suíça e na Inglaterra. A terceira trata da insurreição motivada também pela influência calvinista, foi a “Revolução Gloriosa” na Inglaterra em 1689.

 

            Isso parece pouco, mas impulsionou a formação de uma base intelectual que influenciou o surgimento de pensadores na política, para citar apenas alguns, como na política, Maquiavel e posteriormente os diversos “socialistas utópicos”, na ciência como Francis Bacon; na filosofia, entre outros, Renné Descartes, John Locke, Rousseau, Kant;  na economia Adam Smith; u seja, em todas as áreas do conhecimento foram inovadas.

 

            A culminância do processo de transição dar-se-á, simbolicamente na Revolução Francesa, que será complementada pelas revoluções liberais ocorridas na grande maioria dos países europeus a partir de 1830 até 1852.

 

            Se voltarmos no início da Idade Média, iremos perceber que a nobreza feudal, formara-se dentro do modo de produção escravista e que, desde o século primeiro, d.C. começara o deslocamento para a agricultura, organizando os feudos e transformando os escravos em novos servos, a classe auxiliar de sua sustentação. Quando Império Romano caiu no século V, não havia praticamente mais poder algum centralizado em Roma; ele já estava distribuído pelos diferentes reinados.

 

            Isso tudo nos instiga a pensarmos na superação do capitalismo por meio da indicação de que deveremos construir o período de transição denominado de “socialismo científico”, tendo como fundamento, o próprio avanço do capitalismo.

 

            Como indicações para o estudo, devemos pensar que, embora os acontecimentos históricos e os processos revolucionários não se repetem, mas servem de lições e indicações do caminho a seguir. Em primeiro lugar, devemos perceber que a superação de um modo de produção por outro, se dá porque, o primeiro entra em decadência; não responde mais as necessidades de todas as sociedades, como foi o caso do escravismo e do feudalismo e já está sendo o capitalismo. No entanto, pela visão histórica, na infra-estrutura do sistema anterior forma-se uma base material que como substância física precisa de um lugar, e, como dois corpos físicos não podem estar no mesmo lugar ao mesmo tempo, ela se impõe sobre a base econômica anterior.

 

            Em segundo lugar, formaram-se bases intelectuais de análise e proposições que atacaram todas as posições que já davam sinais de insuficiência gnosiológica, ou seja, teórica, como também àquelas que se aparelhavam para proceder a produção ideológica que falseava à visão da realidade como, as religiões, as concepções educacionais, as compreensões dos verdadeiros problemas filosóficos e sociológicos das identificações e as proposições econômicas e políticas sem alcance de superação.

 

            Não podemos negar de que muitas confusões e limitações que ainda existem estão no modo de compreensão das relações atuais, em que, grande parte das forças de “esquerda” possuem na cabeça a superação do capitalismo real, pelo “capitalismo utópico”, e visam inserirem-se por meio dos governos na estrutura do Estado para realizarem as melhoria ordenadas pela Constituição Federal. E, por outro lado, atuam atreladas às religiões por motivos óbvios, de que são os espaços de aglutinação popular e também, por outro lado, temem o desgaste pelos ataques da velha moral conservadora.

 

            No aspecto econômico, falta-nos uma interpretação adequada ao processo de sustentação do movimento revolucionário, como os procedidos no passado, dirigidos pela nobreza feudal e pela burguesia moderna. O que tivemos em comum nesses dois processos, foi a criação de uma base econômica que impôs novas relações de produção. No caso dos feudos a substituição natural do escravo pelo servo, levou a afirmar a forma de produção feudal, baseada na “Corveia” (pagamento em dias de trabalho) ou a “Talha” (pagamento em produto).

 

            Para superar o feudalismo a burguesia agarrou-se à forma mercadoria e, com ela criou algo que a antecede, que é a indústria, e algo que a sucede, que é o mercado. Para produzi-la e comercializá-la criou o proprietário da força de trabalho que pode vendê-la como uma mercadoria, porque, não sendo proprietário dos meios de produção, se quiser viver, terá que trocar a força de trabalho pelo salário.

 

            A pergunta que as forças de esquerda e intelectuais com ela ou não envolvidos, não conseguem responder é: se a nobreza, para superar o escravismo, criou a sua base econômica nos feudos, e, se a burguesia, para superar o feudalismo criou a indústria e o comércio, qual será a base econômica a ser criada pelos trabalhadores para superar o capitalismo?

 

            Parece uma pergunta sem resposta, isto porque, se o trabalhador é proprietário da força de trabalho ele depende do mercado para encontrar um comprador para vendê-la, que é o mesmo sujeito burguês, dono da indústria e do comércio. Os próprios trabalhadores que trabalham em cooperativa ou agricultores que não vendem força de trabalho dependem do comércio para distribuírem os seus produtos.

 

            Por outro lado, a resposta à mesma pergunta é bastante simples, se aplicarmos o paradoxo da vida e morte. Ou seja, quando os burgueses lutaram para implementar o modo de produção capitalista, aceitaram e submeteram-se às leis da própria formação da riqueza que se resume em três formas: mercadoria, dinheiro e capital. Nesse sentido, para ser rico, um burguês precisa ter uma ou as três formas de riqueza e obedecer as leis econômicas que se localização na produção, concentração, centralização e expansão do capital.

 

            No entanto, como burguês não produzia a sua riqueza, sozinho, ele teve de transformar o antigo servo em proprietário de sua força de trabalho para comprá-la. Foi, portanto, essa força de trabalho que produz a riqueza historicamente, mas, devido uma lei da produção, que denominada como “mais-valia” ao explorar a força de trabalho, retira do trabalhador o salário que ele recebe e mais a parte que ficará acumulada como excedente e que, anexado ao valor investido, faz crescer o capital e a riqueza.

 

            Se a nobreza feudal criou o feudalismo, ela não poderia ser a força discordante para vir a criar o capitalismo. Da mesma forma, se a burguesia criou o capitalismo, não será ela que se interessará por destruí-lo. Logo, como lemos na teoria do “Socialismo científico”, o socialismo virá pela luta dos trabalhadores. Mas qual seria a base econômica destes para implodirem o capitalismo? A mesma que sustenta os capitalistas.

 

            Não há outra alternativa. Toda riqueza, seja ela vinculada à mercadoria, na acumulação do capital e o dinheiro, tem a sua origem na extração da mais-valia, ou se quisermos, no trabalho não pago aos trabalhadores. De modo que, ao longo da História do capitalismo, os trabalhadores ao produzirem a riqueza para os burgueses, produziram também a sua base material, para superarem o modo de produção capitalista. Falta criar as condições para apossar-se desta riqueza e distribuí-la. Isto não pode ocorrer no capitalismo, precisa ir além.

 

            Os capitalistas utópicos de esquerda que desejam “humanizar” o capitalismo fazem um grande mal aos trabalhadores e as massas desvalidas, porque, prolongam a agonia dos sofredores que depositam esperanças em processos falseadores, como as disputas eleitorais; as políticas públicas; as ajudas emergenciais etc., fazendo com que, as revoltas semelhantemente as que a burguesia fez para implantar o capitalismo, sejam adiadas e o capitalismo decadente continua a fazer vítimas.

 

            Tudo depende de atitudes. Elas precisam marcar posição em todos os sentidos, mas, principalmente na política, que remete a ter que fazer escolhas e tomar decisões. Enquanto os representantes dos trabalhadores acreditarem em soluções capitalistas, a burguesia continuará sendo classe dominante.


Ademar Bogo

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