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sábado, 14 de agosto de 2021

MEU ENCONTRO PESSOAL COM FIDEL CASTRO * Emerson Xavier / PE

MEU ENCONTRO PESSOAL COM FIDEL CASTRO

Pediram-me que escrevesse um texto por ocasião do natalício do companheiro Fidel Castro. Num primeiro momento, fiquei deveras confuso por não conseguir me ver em tal honrosa posição. Que mais poderia eu dizer sobre Fidel depois de tantos testemunhos verdadeiros de pessoas que estiveram ao seu lado em decisivos momentos da história da humanidade? Estive quatro vezes em Cuba, tive a felicidade de ver o Comandante pela televisão cubana e de observar como todos a minha volta se energizavam ouvindo suas palavras. No entanto, nunca tive a honra de ver Fidel, nem mesmo de longe. Assim sendo, pensei que, se tentasse discorrer sobre Fidel, só conseguiria no máximo produzir algum texto medíocre, laudatório e finalmente aborrecido, desprovido de qualquer interesse. Afinal de contas, eu nunca havia encontrado Fidel. Imobilizado por essa impossibilidade, recolhi-me ao meu silêncio, sempre amargando o fato de nunca ter encontrado aquele que semeara rebeldia e liberdade em diferentes continentes, em rincões longínquos onde ele nunca pusera os pés. Sim, Fidel se fizera presente em todas as lutas pela liberdade e por uma verdadeira democracia nas mais variadas línguas, sob as mais diversas latitudes. Em todas as minhas andanças por esse grande mundo, vi pessoas que se inspiravam na coragem e na ousadia de Fidel Castro Ruz para lutar por conquistas que a muitos pareciam impossíveis. Nessa etapa de minha reflexão, percebi meu equívoco inicial. Eu havia, sim, encontrado Fidel. Eu também havia escutado suas palavras e recebido a graça de seus influxos. Lembrei então de cada momento daquele encontro, que ora compartilho.


Voltávamos de uma visita a uma cooperativa agrícola cubana no que carro de função que dirigia Joaquín, um companheiro engenheiro agrônomo. Em determinado ponto, fomos abordados por um guarda no que parecia um paradeiro de ônibus. Queria saber aonde íamos e se podíamos levar duas pessoas até certa altura. O companheiro agrônomo me explicou em poucas palavras. Depois do colapso do sistema de transportes devido ao bloqueio, todos os carros públicos têm o dever de oferecer caronas aos cidadãos e às cidadãs. Tudo sendo devidamente registrado, inclusive eventuais recusas a oferecer as caronas, que deverão ser ulteriormente explicadas nas unidades de trabalho concernidas.


Duas pessoas sentaram-se no banco de trás. Eram dois trabalhadores que até bem pouco tempo deviam estar exercendo alguma atividade fisicamente muito exigente. Um deles, um senhor negro, muito robusto e de fala muito pausada, tinha rasgado a camisa que portava ao fazer algum esforço.


No banco da frente, Joaquín terminava de contar-me mais uma história das grandes batalhas populares dos cubanos, que concluiu com algo como: “Foi algo tão grandioso quanto Cuito Canevale!” Ao que respondi, ignorando ainda a comoção que causaria: “Cuito Canevale? O que foi isso?”.


As pessoas se entreolharam. Parecia absurdo que alguém na face da terra ignorasse ainda o que fora a batalha de Cuito Canevale e suas consequências para toda a humanidade. E, de fato, agora sei, é realmente absurdo que sejamos ainda tantos a ignorar aquela gesta acontecida no solo comum de nossos antepassados, a África.


O moço da camisa rasgada, que falava como o melhor professor, explicou-me tudo com muito cuidado, para que minha ignorância anterior não me ruborizasse tanto. As tropas de voluntários cubanos estavam cercadas em Angola pelo quinto exército do mundo de então, o exército da África do Sul, do apartheid, aquele odioso regime que se impunha à maioria negra graças ao apoio criminoso e fanático da França, dos Estados Unidos, do Reino Unido e de outras entidades imperialistas.


Aquele cerco parecia fatal. Uma derrota nos campos africanos, sabia Fidel, poderia acarretar até mesmo o fim da Revolução cubana. Aos soldados cubanos, tudo faltava em Cuito Canevale, até mesmo rações suficientes de água. Radiadores de tanques haviam sido esvaziados para matar alguma sede e tudo parecia perdido. Em Havana, com mapas precisos e outras informações suplementares, o Comandante Fidel Castro traçou as linhas que conduziriam à grande vitória. Uma pista de aterrissagem foi improvisada, o que permitiu abastecer os voluntários cubanos em víveres e munições. Era só disso que necessitavam aqueles companheiros de Fidel para vencer o quinto exército do mundo, pois o essencial nunca lhes havia faltado: a consciência revolucionária, a clareza quanto ao papel que estariam desempenhando em favor da paz e da justiça. Eram companheiros de armas de Fidel, e também de José Martí, que havia anunciado um século antes: Pátria é Humanidade.

E os soldados cubanos venceram o exército do apartheid, que foi definitivamente expulso de Angola.

Compreendi então por que Nelson Mandela havia dito solenemente, e com muita insistência, que o vencedor do apartheid sul-africano não era outro senão Fidel Castro Ruz, o continuador de José Martí.

Senti vergonha por ter ignorado durante tanto tempo o que foi a batalha gloriosa de Cuito Canevale. Pedi sinceramente perdão aos meus novos amigos cubanos e tentei explicar-lhes como o bloqueio informativo também nos atinge a nós que vivemos sob outros apartheids. Meus novos amigos foram generosos e complacentes. Não queriam que minha anterior ignorância me deixasse tão mal. Ao mesmo tempo, eles nem tentavam disfarçar o imenso orgulho de serem revolucionários cubanos, o imenso orgulho de serem companheiros de Fidel.

Era minha primeira visita a Cuba. Fidel ainda estava fisicamente entre nós. Mas ele já se havia multiplicado. Naquele momento, Fidel já era milhões. Aquele trabalhador ao mesmo tempo humilde e orgulhoso também era Fidel. E disso tinha plena consciência. Tenho pois a legitimidade de cria carecer para escrever esta crônica. Eu estive com Fidel, conversei com ele, apertei-lhe a mão. Era um canavieiro negro e robusto de menos de 40 anos, havia rasgado uma camisa ao fazer um esforço físico e continuava sua labuta. Aquele homem, que ninguém duvide, era o próprio Fidel.

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