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domingo, 6 de novembro de 2022

MUSICAL TEMPO DE RESISTÊNCIA * Leopoldo Paulino - SP

MUSICAL TEMPO DE RESISTÊNCIA

Leopoldo Paulino.SP


Criado em 2012, o musical possui trinta minutos, com voz e violão de Leopoldo Paulino, leitura dramática dos textos por Rose Paulino e Matheus Soares como percussionista.


O Musical “Tempo de Resistência” contempla músicas de grandes talentos da Música Popular Brasileira como Chico Buarque, Paulo César Pinheiro, Maurício Tapajós, Vinícius de Moraes, Toquinho, João Bosco, Aldir Blanc, Marcos Valle, Paulo Sergio Valle e Geraldo Vandré - além de uma música cubana de Carlos Puebla em homenagem a Che Guevara.


Leopoldo Paulino.SP

quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Milton Nascimento ainda Bituca * Eduardo Afonso / MG

 MILTON NASCIMENTO AINDA BITUCA

Sonhos não envelhecem

Por Eduardo Affonso

08/01/2022 


Emoldurado por um teatro desoladoramente vazio e sob as palmas apenas da orquestra, um homem caminha, amparado, até sua cadeira, na boca de cena. Ali, ouve em silêncio os primeiros acordes de canções compostas há meio século — ou teria sido há meia hora? E então solta a voz — aquela que Elis Regina disse ser a de Deus, se Deus tivesse uma voz.


A voz de Deus não tem mais o timbre, a potência, a extensão de outros tempos. Mas é, ainda, solene, terna, envolvente. Divina.


Quem está ali é Milton Nascimento, cercado de novos arranjos, jovens artistas e músicos embevecidos com o compositor que não precisou escolher entre ser moderno ou eterno. Sua arte esteve sempre impregnada de uma ancestralidade e uma modernidade atemporais. Milton é aquela esquina onde se cruzaram os Beatles e a música sacra, San Vicente e o Beco do Mota, o jazz e o que se dançava nos bailes da vida. Ao cantar Três Pontas, cantou o mundo.


Diferentemente dos outros grandes da sua geração, não foi preso, não teve de se exilar. Sua prisão foi a censura; seu exílio, o das palavras. Do encontro com Clementina de Jesus, salvou-se um refrão; restou uma invocação do que seria um dueto com Dorival Caymmi. Nem por isso Milton deixou de fazer do “Milagre dos peixes” um dos seus discos mais eloquentes: a voz era um instrumento que não se podia censurar.


Milton sempre foi de falar pouco e, com sua música, dizer o indizível. Sem alarde, compôs uma poderosa trilha sonora para nossa época. Vestiu os versos viscerais de Ruy Guerra (Meus gritos, afro-latidos / Implodem, rasgam, esganam, E tudo aquilo de que fujo / Tirou prêmio, aval e posto) em “E daí?”. A utopia de “Primeiro de maio”, a metáfora do “Cio da terra”, parcerias com Chico Buarque. É seu, com Wagner Tiso, o hino das Diretas Já e da redemocratização (E há que se cuidar do broto / Pra que a vida nos dê flor / E fruto). Com Caetano Veloso, a celebração de que Qualquer maneira de amor vale a pena.


Sua militância, com Fernando Brant, foi a da amizade. É solidariedade a ideologia que perpassa a canção do sal, a missa dos quilombos, o afeto por uma gente que ri / quando deve chorar / e não vive / apenas aguenta.


Milton tornou mais belas as palavras de Carlos Drummond, Fernando Pessoa, Manuel Bandeira, Ferreira Gullar, desentranhando melodias tão inspiradas quanto os versos — sem jamais ofuscá-los. Soube ser reverente e à altura dos mestres que musicou.


Quando tenho saudades de mim — do menino, do moleque, do homem que eu era, de tudo que eu podia ser —, ouço Milton, e ele me reconcilia comigo. 


No Cine-Theatro Central de Juiz de Fora — onde se apresentou na noite de 29 de dezembro, com a Orquestra Ouro Preto —, cada cadeira vazia evocava um dos milhões que o guardam do lado esquerdo do peito, que fizeram ao som da sua voz a travessia das últimas cinco, seis décadas.


Em 2022, chegando aos 80 anos, Milton vai mais uma vez aonde o povo está, na turnê “A última sessão de música”. Uma série de encontros e despedidas, em que Bituca, velho maquinista com seu boné, de sorriso aberto e roupa nova, vem renovar a nossa fé.


AUTOR:  EDUARDO AFFONSO -  arquiteto, cronista, ligado na psicanálise, um mineiro vegetariano que só não é vegano porque não consegue largar o queijo.

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