Extrema direita recruta para novos ataques e crianças de 10 anos já estão em comunidades de ódio,
diz antropóloga.»
Isabela Kalil /isabelakalil.com
O STF na noite de quarta (13/11) – Sergio Lima/Poder360
Para Isabela Kalil, do Observatório da Extrema Direita, “novos ataques à praça dos Três Poderes“ dependerão “da resposta que vamos dar a esses ataques”, pois “o atentado de anteontem tem duas consequências: o efeito de repetição, de outras pessoas quererem fazer coisas parecidas, e o de contágio”
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A antropóloga Isabela Kalil, do Observatório da Extrema Direita, afirma que o atentado na praça dos Três Poderes está ligado ao 8 de Janeiro e ressalta a necessidade de o governo responder de forma eficaz aos ataques motivados por discursos de ódio, para evitar que eles se repitam.
“[Wanderley Luiz] não é um lobo solitário“, diz a especialista. A extrema direita estaria, segundo ela, recrutando cada vez mais pessoas, sobretudo homens e até mesmo crianças. “A parte do recrutamento começa muito cedo“, afirmou, conforme transcrição no UOL, em matéria deste sábado (16/11).
A especialista explica que o incentivo da extrema direita a ataques como o que aconteceu na praça dos Três Poderes começa em ambiente virtual. “Mas não se dá apenas pela internet. Agora temos eventos, mobilizações de massa, como manifestações. É mais complexo“, diz.
“Crianças de 10 anos já estão nessas comunidades de ódio. Em camadas iniciais de recrutamento, essas pessoas não sabem que parte do grupo exerce ataques motivados por ódio a determinados grupos sociais. Há uma espécie de contentamento em ver ataques violentos contra esses grupos. São grupos misóginos, que pregam o ódio às mulheres, compartilham imagens de crimes, inclusive de mortes de mulheres. Outro tipo de grupo que é muito comum é os de supremacistas brancos“, afirmou Isabela Kalil.
A pesquisadora Kalil destaca que grupos extremistas melhoraram suas estratégias de recrutamento masculino, incentivando esses homens a ressignificarem suas vidas por meio da sensação de pertencimento.
“A pessoa entra em contato com um determinado grupo, onde é exposta a conteúdos também extremistas. À medida que essas pessoas participam de grupos cada vez mais restritos, um integrante que não era violento, tinha uma vida pacata, de repente se envolve em atos tão extremos. No caso das crianças, esse recrutamento pode ser feito por vídeos de heróis, pela cultura pop, pelo entretenimento, pela música e até mesmo por grupos que debatem videogames. Ninguém diz ‘vai lá e solta uma bomba’, mas diz ‘assista a este vídeo’, ‘participe de tal canal’. Esse recrutamento é passivo“, disse Kalil.
Kalil diz que, então, essa pessoa se tornará membro daquela comunidade, buscando mais conteúdos sobre aquilo. “Passa a ter senso de pertencimento com aquele grupo e vincular o seu propósito de vida a esse pertencimento“, explica. “No caso de anteontem [das bombas na praça dos Três Poderes], me chamou bastante atenção que ele estava com uma vestimenta [que fazia alusão ao Coringa]. Ele se produziu para ser visto e fotografado. Essas pessoas se vestem para prestar contas para a sua comunidade. Ele está ali para dizer ‘eu fiz’“, dia a antropóloga.
Kalil afirma acreditar que, mesmo que essas pessoas façam ataques isolados, elas fazem parte da mesma comunidade de ódio ou da mesma comunidade extremista. “A ideia de lobo solitário, de alguém que não participa de uma comunidade ou agenda específica e acaba tomando uma atitude totalmente individual, foi usada para explicar determinados atentados e dizer que são casos isolados“, afirma. Mas, segundo ela, há um padrão.
“Existe repetição, como nas escolas, de que o mês de abril é geralmente escolhido e é um período crítico, porque é quando acontece o aniversário de Hitler. Alguns atos parecem inofensivos, mas foram preparatórios para o 8 de Janeiro. Depois, o próprio 8 de Janeiro, e agora essas explosões, que são como uma performance do 8 de Janeiro. As motociatas são alguns desses atos preparatórios onde circulam mensagens disruptivas, falas como a do [ex-presidente Jair] Bolsonaro dizendo que não aceitaria decisões judiciais ou não usaria máscara — não são falas normais. Ele está ali comunicando que não respeita decisões judiciais, mesmo sendo chefe de Estado“, afirma a pesquisadora.
Os extremistas não confiam no Estado e, ao praticarem atos violentos como as explosões na praça dos Três Poderes, ignoram as punições, representando um desafio para o governo.
“As pessoas são punidas pelo que elas fazem, mas muitos desses atos violentos resultam na morte dessas pessoas. Elas não estão mais preocupadas se vão para a prisão ou algo do tipo. A camada que precisa ser debatida é a prevenção. A gente só consegue prevenir se a pessoa ainda estiver sendo recrutada. A partir daí, fica muito complicado“, diz Kalil.
Kalil afirma que, dentro desses recrutamentos, é mais comum a presença de homens. Eles geralmente estão em muitos grupos diferentes. Misóginos, de golpe de Estado, comunidades que se mantêm presentes em diferentes plataformas. Por exemplo: uma comunidade contra o STF é algo comum e bem amplo. “No caso brasileiro, a extrema direita tem repulsa com a constituição de 1988. A extrema direita adota como alvo a constituição de 1988 e, inclusive, as instituições“, afirma.
Questionada sobre a probabilidade de novos ataques ao Estado brasileiro, Kalil diz que, “infelizmente, [essa] tende a ser uma preocupação” e que “se houver uma resposta de prevenção, os ataques tendem a diminuir. Precisamos investir em inteligência e prevenção, para que esses ataques estejam sob controle“.
“Teremos novos ataques à praça dos Três Poderes? Depende da resposta que vamos dar a esses ataques. O atentado de anteontem tem duas consequências: o efeito de repetição, de outras pessoas quererem fazer coisas parecidas, e o de contágio. Se alguém achava que o 8 de Janeiro era uma coisa isolada, foi um equívoco. O risco está aumentando“, afirmou a pesquisadora do Observatório da Extrema Direita, Isabela Kalil.
Ao ler a matéria, o advogado Luiz Carlos da Rocha afirmou que “esse recrutamento claro, flagrante, como foi o caso do homem bomba, exige a regulamentação das redes e rigor no cumprimento das penas dos condenados do 8.1“.
Esse recrutamento claro, flagrante, como foi o caso do homem bomba, exige a regulamentação das redes e rigor no cumprimento das penas dos condenados do 8.1.
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— Luiz Carlos da Rocha ADVOGADO (@rocha_lcr) November 16, 2024
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