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sexta-feira, 11 de novembro de 2022

ANISTIAR BOLSONARO E SUA MILÍCIA JAMAIS * Waldir Porfírio - PB

 ANISTIAR BOLSONARO E SUA MILÍCIA JAMAIS

Waldir Porfírio - PB


Paira no ar um apelo de certos setores da sociedade para que possamos esquecer o que se passou nos últimos quatro anos e olhar para frente. Está incluso nesse plano repetir 1979, quando os generais anistiaram todos os agentes públicos que, em nome do Estado, não respeitaram as regras constitucionais e as convenções internacionais que o Brasil havia aderido. Anistiaram assassinos e torturadores de presos políticos, que violaram os direitos humanos, dando carta branca para que maus policiais militares dessem continuidade para práticas nas comunidades pobres, ao arrepio da lei, de violação de lares, sequestros, torturas, assassinatos e desaparecimento forçados. 


A história não pode repetir esse erro do passado. São inúmeras as violações aos direitos humanos durante o governo Bolsonaro, que transformou o Brasil num estado de exceção, onde sua vontade política desrespeitava as regras constitucionais e legais, utilizando-se da quebra dessas regras até mesmo para tentar ganhar as eleições. Tentou ao máximo subjugar os poderes legislativo e, especialmente, o judiciário, para seus objetivos de normalizar as anomalias que os agentes do Estado estavam praticando. 


Para resolver esse problema, deve-se recorrer à teoria da justiça de transição, que tem como pilares o direito à memória e à verdade (como, por exemplo, as circunstâncias sobre as mortes e a falta de assistência do governo federal às vítimas da COVID); o direito à justiça (investigação e punição para todos que concorreram para essa tragédia); o direito à reparação econômica aos familiares (calcula-se que mais de 170 mil crianças e adolescentes de até 17 anos ficaram órfãs no Brasil); e, por fim, uma reforma nas instituições para fortalece-las no enfrentamento futuro de atrocidades semelhantes. 


Com o título de “Pacificação”, a jornalista Milly Lacombe, em sua coluna no UOL, de 5 de novembro do corrente ano, denuncia a tentativa de intelectuais liberais em defender a anistia e pacificação para os promotores da barbárie que ocorreu no Brasil. Denuncia que estes mesmos intelectuais ficaram calados diante de um governo que afundou o país “violências de todos os tipos, da lentidão para compra de vacinas” e “inúmeros sigilos de 100 anos em qualquer suspeita de malfeito ou corrupção”. Conclui que “não haverá pacificação sem punição” e que “Agora é a hora de colocar todo esse horror na mesa e fazer uma autópsia do que passamos”.


Não resta a menor dúvida de que Milly Lacombe está com toda razão. Não é revanchismo, mas uma oportunidade para que a sociedade tome consciência dos acontecimentos ocorridos. A justiça de transição oferece os elementos necessários para que o Brasil possa voltar à normalidade e desvendar, por meio de uma investigação séria, com participação da sociedade civil, os horrores praticados por esse governo que finda no último dia de 2022. 


Para que isso possa acontecer, os partidos políticos democráticos, dirigentes de entidades representativas do povo e dos movimentos sociais, intelectuais, parlamentares federais, estaduais e municipais, e demais interessados devem exigir das instituições formadas pelos três poderes a realização de investigações sobre as violações aos direitos humanos e o que levou a milhões de pessoas a seguir e defender um governo autoritário, como o que se finda.


-PAPUDA NELLLES-


(Waldir Porfírio: Escritor, psicólogo, advogado, mestre em direitos humanos, políticas públicas e cidadania, ex-membro da Comissão Estadual da Verdade da Paraíba, e membro do Instituto Histórico e Geográfico Paraibano)

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quarta-feira, 9 de novembro de 2022

FAMILÍCIA BOLSONARO NA CADEIA * Hélio Schwartsman / Oscar Vilhena Vieira / FRT

FAMILÍCIA BOLSONARO NA CADEIA

 Por que Bolsonaro precisa ser punido

Se nada ocorrer, todas as autoridades se sentirão livres para fazer o mesmo a cada quatro anos

Hélio Schwartsman

4.nov.2022 às 17h30


No mundo ideal preconizado por alguns manuais de direito, autoridades não têm a opção de deixar barato. Se existe a suspeita de que um crime foi cometido, o Estado precisa investigá-lo e, se for o caso, processar e condenar seus autores. No mundo sublunar, sabemos que não é bem assim. Por bons e maus motivos, autoridades frequentemente fecham os olhos para algumas situações.


Em breve, Jair Bolsonaro perderá imunidades e o foro especial. Ele deve ser responsabilizado pelos delitos que cometeu? Penso que sim, mas isso não é motivo para não examinarmos a argumentação dos que defendem o contrário. E ela é essencialmente política. Cassar os direitos políticos de Bolsonaro e colocá-lo na cadeia o transformariam numa espécie de mártir para seus seguidores, acentuando ainda mais a polarização.


Para uma corrente da ciência política, o que faz a democracia funcionar é justamente o fato de os derrotados nas urnas nunca perderem muito, o que torna entregar o poder pacificamente e aguardar uma oportunidade de voltar pelo voto a opção mais racional.


Embora os panos quentes possam facilitar a administração dos rancores políticos nos próximos tempos, eles criariam, acredito, precedentes que, no longo prazo, tendem a ser muito negativos, mesmo numa avaliação consequencialista. Bolsonaro não barbarizou só na pandemia, um evento que talvez não se repita tão cedo. Ele também fustigou as instituições e afundou as contas públicas para se reeleger. Se isso ficar sem punição, todas as autoridades se sentirão livres para fazer o mesmo a cada quatro anos.


Há complicadores. Bolsonaro não agiu só. Baluartes do Legislativo, que já vão se bandeando para o lado do futuro governo, foram no mínimo cúmplices do atual presidente. Alguém acha que serão punidos?


A administração da justiça como preconizam os manuais talvez seja uma impossibilidade, se não teórica, prática.

Enquadrado pelo Supremo


A 'rendição' de Bolsonaro se deu perante um tribunal que não se curvou aos seus ataques


4.nov.2022 às 17h46


"Acabou". Essa é a expressão empregada pelo presidente Jair Bolsonaro ao reconhecer sua derrota eleitoral aos ministros do Supremo Tribunal Federal. É significativo que a "rendição" tenha se dado perante um tribunal que não se curvou aos seus ataques, ameaças e desmandos.


Uso o termo rendição pois Bolsonaro sempre teve uma visão degenerada da política. Como outros líderes de extrema direita, Bolsonaro concebe a política não como uma disputa entre adversários, mediada por regras e instituições, mas como uma guerra. Guerra que tem por finalidade eliminar os inimigos e subjugar as instituições voltadas a limitar o poder.


Há um velho ditado da caserna que vaticina: "Na vida militar, ou você coloca os demais em forma ou te colocam em forma". Ao longo desses quatro anos de governo, Bolsonaro buscou enquadrar o Supremo. Ameaçou desrespeitar suas decisões. Ofendeu de forma vulgar ministros. Atiçou seus acólitos contra o tribunal. Incitou o pedido de impeachment de magistrados. Instigou as Forças Armadas contra o Supremo, insinuando que elas, e não o Supremo, receberam a missão de guardar a Constituição. Derrotado nas urnas e sem o proclamado apoio das Forças Armadas, viu-se obrigado a se submeter à autoridade do Supremo.


Para alguns, o Supremo foi além de suas atribuições nestes últimos anos. Discordo. O Supremo, apesar de seus defeitos, apenas reagiu aos ataques à democracia e aos direitos fundamentais desfechados pelo presidente, cumprindo a atribuição que lhe foi conferida pela mais democrática de nossas constituições.


Uma das mais amargas lições deixadas pela ascensão de Hitler ao poder —reiterada pela nova onda de populistas autoritários— é que o povo pode, pelo voto ou por meio de seus representantes, destruir a democracia e os direitos humanos.


Por essa razão, muitos países que se reconstitucionalizaram após as barbáries da Segunda Guerra, ou as experiências perversas da colonização, da segregação racial, dos regimes militares ou de partido único, optaram por conferir às suas cortes constitucionais a tarefa de defender a democracia e os direitos humanos.


Não se trata de uma tarefa fácil e destituída de riscos. Afinal, tribunais não têm artilharia. Muitas cortes altivas sucumbiram nessa jornada. Outras preferiram se omitir em relação aos avanços autoritários, na esperança de serem as últimas a serem devoradas, para tomar emprestado a imagem de Churchill.


Com audácia, o Supremo não se deixou intimidar e agiu para conter o vandalismo institucional de Bolsonaro e seus aliados. Seus tropeços não o impediram de cumprir sua missão. Essa postura independente só foi possível pela conjugação de três fatores. De um lado, as prerrogativas, garantias e incentivos superlativos recebidos pelo Supremo para servir como guardião da ambiciosa Constituição de 1988. De outro, a musculatura política e institucional adquirida ao longo das últimas décadas, em decorrência das inúmeras crises e insuficiências do próprio sistema político que impuseram ao tribunal a necessidade de tomar decisões com forte impacto político. Por fim, o compromisso da maioria de seus ministros com o Pacto de 1988.


O fato é que o Supremo brasileiro, assim como o Tribunal Superior Eleitoral, não capitulou. Deixou claro à extrema direita que não abriria mão de sua obrigação de defender a Constituição. Que não aceitaria um golpe transvestido de legalidade. Enquadrado pelo Supremo, o presidente finalmente reconheceu sua derrota.


Oscar Vilhena Vieira


Professor da FGV Direito SP, mestre em direito pela Universidade Columbia (EUA) e doutor em ciência política pela USP.