segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Saga de Yemoja 10 anos na Barra da Tijuca * Projeto Samba do Joá

 Saga de Yemoja 10 anos na Barra da Tijuca

quebra mar da Av. do Pepe praia dos Amores posto 01.


 Nosso objetivo convidar todos, todas, todxs para Celebrar o


10 XIRE EM LOUVOR A RAINHA DO MAR.


Onde postaremos informes, fotos e vídeo sobre o presente de yemoja na BarraSaude e Paz.


Ase Ô Aro lê Ode Bênção


Com apoio da prefeitura iremos louvar 10 anos do Xire de yemoja na Barra da Tijuca. Dentro dos protocolos de segurança usando máscara  e álcool gel  esperamos por vc Ase Ô Aro lê Ode Bênção




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O pardo segundo o IBGE * Francisco Gonçalves Queiroz Payayá / BA

 

O PARDO COMO PROBLEMÁTICA NA SOCIEDADE BAIANA E A CLASSIFICAÇÃO DO IBGE EM ‘COR E RAÇA’ Francisco Gonçalves Queiroz Payayá

Proibido esquecer Douglas Bravo * Coordenadoria Simón Bolívar / Ve

 PROIBIDO ESQUECER

DOUGLAS BRAVO

A Coordenadoria Simón Bolívar lembra de você com carinho, afeto e respeito
um ano após sua partida, o camarada Douglas Ignacio Bravo Mora, um
referindo-se a um momento histórico importante em nossa história
contemporânea, que marcou para sempre a vida de uma geração.

No domingo, 31 de janeiro de 2021, nas primeiras horas da manhã, você partiu
para outro avião, aos 88 anos, o comandante da guerrilha Douglas
Bravo, considerado um dos mais lendários guerrilheiros venezuelanos
e o principal líder do FALN nas décadas de 1960 e 1970.

Douglas Ignacio Bravo Mora nasceu em Cabure, estado de Falcón, em 11
Março de 1932. Em 1946 ingressou no Partido Comunista; desta
organização seria expulsa em 1965.

Em 1962 fundou a Frente de Guerrilha José Leonardo Chirino, que
lutou contra regimes opressivos da AD; em 1966 fundou o PRV (Partido
da Revolução Venezuelana), mais tarde criou o Ruptura e
Terceiro Caminho.

Douglas acompanhou o comandante Chávez na insurreição
reunião cívico-militar em 4 de fevereiro de 1992, e também participou da
gesto de 27 de novembro de 1992, pelo qual permaneceu alguns
meses no Quartel de San Carlos, junto com o camarada Carlos Reiter
militante revolucionário da paróquia 23 de janeiro.

Resgatando a Memória Histórica.

Para cima aqueles que lutam! ! !

A única luta que se perde é a que se abandona! ! !

Só a luta nos libertará! ! !

Da Venezuela 🇻🇪 Terra de Libertadores 530 anos após o início da
a Resistência Anti-imperialista na América e 211 anos após o início da
nossa independência.

Coordenadoria Simão Bolívar
Caracas - Venezuela 🇻🇪.
Janeiro de 2022.

Desaparecidos políticos: Ísis Dias de Oliveira/ALN * Liga Latinoamericana de Irredentos

DESAPARECIDOS POLÍTICOS:
ÍSIS DIAS DE OLIVEIRA

50 anos do Desaparecimento Político de Ísis Dias de Oliveira.(30/01/1972 - 30/01/2022)
Mulher, jovem (29 anos), pianista, artista plástica, universitária, professora de cursinho popular de vestibular, militante estudantil, revolucionária, desenvolveu diversas atividades clandestinas de imprensa e contatos internacionais, atuava no núcleo estratégico de Carlos Marighella (ALN).
Ísis foi perseguida, presa e morta pela Ditadura Cívico-Militar (conforme documento do SNI de 11 de setembro de 1975 que noticia a sua morte em 31 de janeiro de 1972- documento esse encontrado pelo seu ex-marido José Luiz Del Roio).
Ela foi presa no dia 30 de janeiro de 1972 pelo Doi-Codi do Rio de Janeiro e até o dia hoje, 50 ANOS DEPOIS!, os seus restos mortais não foram encontrados.
Dona Felícia, mãe de Ísis, dedicou todos os dias de sua vida na busca pela sua filha e morreu sem que o Estado Brasileiro lhe tivesse feito justiça.
"Quando eu não puder mais falar, vocês falarão por mim" dizia Dona Felícia. Pois bem, continuemos na luta pela verdade dos fatos históricos.
Que a memória vença o negacionismo histórico!
A melhor homenagem que podemos fazer a essa juventude que lutou contra a ditadura e a favor da democracia é a de darmos continuidade as suas lutas.
Que o cinquentenário do desaparecimento de Ísis Dias de Oliveira nos motive a lutar contra os herdeiros da ditadura.
Esse é o ano de derrotar o presidente que tem nos torturadores os seus principais herois.
Esse é o ano de dar a resposta a quem chamou de cachorro aqueles que tentam encontrar os ossos dos desaparecidos para que sejam devolvidos as suas famílias - ainda que tardiamente.
Esse é o ano de acabar com a política que cotidianamente atrapalha o trabalho da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos (criada em 1995) e que nega o Relatório realizado pela Comissão Nacional da Verdade (2011-2014).
Que não cheguemos ao centenário do desaparecimento de Ísis sem saber o que ocorreu com ela e com os demais desaparecidos políticos!
...
Mais Informações sobre Ísis: verificar o Relatório da Comissão da Verdade volume 3, a partir da página 831, link: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/.../volume_3_digital.pdf
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"Recomenda-se a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso para a localização de seus restos mortais, identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos" p. 835 do volume 3 do Relatório da Comissão Nacional da Verdade.
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A foto de Ísis me foi enviada por Sônia Irene Silva do Carmo, amiga, companheira de atividade política e colega de Ísis Dias de Oliveira.
(SARDINHA)
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PRISÃO PERPÉTUA PARA TODOS OS CRIMES DA DITADURA MILITAR * Frente Revolucionária dos Trabalhadores/FRT

 PRISÃO PERPÉTUA PARA TODOS OS CRIMES DA DITADURA MILITAR

Marcelo Paixão de Araújo debruçou-se sobre uma mesa de vidro, na sala de seu amplo apartamento, em Belo Horizonte, pediu à empregada para trazer biscoitos, água mineral e café — e prestou a VEJA um histórico depoimento de quase duas horas. Com ele, tornou-se o primeiro agente da repressão a admitir em público que torturava presos políticos durante a ditadura militar. Hoje, passados trinta anos, sua vida é tranqüila. Herdeiro dos fundadores do sólido Banco Mercantil, Marcelo Paixão de Araújo formou-se em direito e trabalha como corretor de seguros, em Betim, a 30 quilômetros de Belo Horizonte, para onde vai dirigindo seu Toyota do ano. Casado, duas filhas, acaba de mudar-se para um apartamento de 300 metros quadrados, na região da Savassi, um dos bairros mais chiques da capital mineira. Apesar dos 15 quilos acima do peso ideal, ele maneja seu barco no lago de Furnas, onde tem uma casa para os fins de semana. De manhã, lê por uma hora, antes de sair para o trabalho. Em casa, tem uma biblioteca de 2.500 volumes, onde se podem encontrar desde clássicos da literatura brasileira até manuais de tortura. Ele gosta de livros de política e de História e, nos últimos tempos, tem-se dedicado à leitura de biografias. Leu A Lanterna na Popa, do ex-ministro Roberto Campos, e Chatô, o Rei do Brasil, do jornalista Fernando Morais.


"A tortura causa um desgaste muito grande. Nunca me neguei a torturar alguém, mas só fazia quando havia necessidade. Mas a brincadeirinha não tem a menor graça, viu?" (risos)

(Está no espeto de satanaz desde 2009)

Em 1968, Marcelo Paixão de Araújo servia como tenente no 12º Regimento de Infantaria do Exército em Belo Horizonte, um dos três centros mais conhecidos de tortura da capital mineira durante a ditadura militar. Ali, permaneceu até 1971. "Fiquei porque achava que a única forma de consertar o país era por meio das Forças Armadas", diz. Ao deixar a caserna, foi trabalhar na empresa do pai, a Minas Brasil, braço de seguros do Banco Mercantil, onde ocupava o cargo de superintendente técnico. Raríssimas vezes usava terno e gravata. Preferia trabalhar de calça jeans. "Ele era diferente do pai e dos irmãos. Era um moleque, uma pessoa muito alegre, que vivia contando piada", diz uma ex-funcionária da empresa. "Descobri que eu não havia nascido para ser executivo", conta Marcelo. Ali, trabalhou seis anos, mas teve tantos problemas que saiu da empresa para o divã do analista. Fez sete anos de análise. Ele garante que não recorreu ao divã em função da passagem pelo porão e diz que vive em paz com seu passado. Na entrevista a VEJA, o ex-tenente alternou estados de humor, indo da descontração à rispidez em segundos. Aqui, ele conta como e por que torturou três dezenas de presos políticos, de 1968 a 1971:


O engenheiro Leovi Carísio, hoje com 52 anos, foi uma das vítimas de tortura do ex-tenente. Era militante do grupo Colina/VAR-Palmares, ficou mais de três anos preso e passou pelo pau-de-arara, "esticamento" e tomou choque. Ele explica: "Marcelo me obrigava a deitar de costas numa mesa. Aí, ele amarrava meus punhos e tornozelos aos pés da mesa e puxava de um lado ao outro até envergar meu tronco. Era horrível" Foto: Moreira Mariz  


Veja — Durante a ditadura, em depoimentos na Justiça Militar, 22 presos políticos acusam o senhor de tortura. É verdade?


Araújo — Quem lhe disse isso?


Veja — Vi nos processos na Justiça Militar. E, pela quantidade de presos que o citaram, o senhor é o agente da repressão que mais praticou torturas. É verdade?


Araújo — Sim. Todos os depoimentos de presos que me acusam de tortura são verdadeiros.


Veja — O senhor fez isso cumprindo ordens ou achava que deveria fazê-lo?


Araújo — Eu poderia alegar questões de consciência e não participar. Fiz porque achava que era necessário. É evidente que eu cumpria ordens. Mas aceitei as ordens. Não quero passar a idéia de que era um bitolado. Recebi ordens, diretrizes, mas eu estava pronto para aceitá-las e cumpri-las. Não pense que eu fui forçado ou envolvido. Nada disso. Se deixássemos VPR, Polop (organizações terroristas) ou o que fosse tomar o poder ou entregá-lo a alguém, quem se aproveitaria disso seriam os comunistas. Não queríamos que o Brasil virasse o Chile de Salvador Allende. Nessa época, eu tinha 21 anos, mas não era nenhum menino ingênuo (risos). O pau comia mesmo. Quem falar que não havia tortura é um idiota.


Ex-militante do PCB, três anos de cadeia, o hoje professor de História Ápio Costa Rosa, 57 anos, carrega marcas físicas da tortura. "Marcelo apagava cigarro no meu corpo, mas a pior coisa que ele fez foi me deitar no chão, colocar um cabo de vassoura no meu pescoço e subir em cima. Aí, quando eu ia respirar, ele derramava óleo no meu rosto. Estou pagando por isso tudo até hoje", diz


Veja — Como o senhor aprendeu a torturar?


Araújo — Vendo.


Veja — O que o senhor fazia?


Araújo — A primeira coisa era jogar o sujeito no meio de uma sala, tirar a roupa dele e começar a gritar para ele entregar o ponto (lugar marcado para encontros), os militantes do grupo. Era o primeiro estágio. Se ele resistisse, tinha um segundo estágio, que era, vamos dizer assim, mais porrada. Um dava tapa na cara. Outro, soco na boca do estômago. Um terceiro, soco no rim. Tudo para ver se ele falava. Se não falava, tinha dois caminhos. Dependia muito de quem aplicava a tortura. Eu gostava muito de aplicar a palmatória. É muito doloroso, mas faz o sujeito falar. Eu era muito bom na palmatória.


Veja — Como funciona a palmatória?


Araújo — Você manda o sujeito abrir a mão. O pior é que, de tão desmoralizado, ele abre. Aí se aplicam dez, quinze bolos na mão dele com força. A mão fica roxa. Ele fala. A etapa seguinte era o famoso telefone das Forças Armadas. Tinha gente que dizia que no telefone vinha inscrito US Army (indicando que era produto das Forças Armadas americanas). Balela. Era 100% brasileiro. O método foi muito usado nos Estados Unidos e na Inglaterra, mas o nosso equipamento era brasileiro.


Veja — E o que é o telefone?


Araújo — É uma corrente de baixa amperagem e alta voltagem.


Veja — De quanto?


Araújo — Posso pegar o manual para informar com certeza. Mas não tem perigo de fazer mal. Eu gostava muito de ligar nas duas pontas dos dedos. Pode ligar numa mão e na orelha, mas sempre do mesmo lado do corpo. O sujeito fica arrasado. O que não se pode fazer é deixar a corrente passar pelo coração. Aí mata.


Veja — Qual era o estágio seguinte quando o preso não falava?


Araújo — O último estágio em que cheguei foi o pau-de-arara com choque. Isso era para o queixo-duro, o cara que não abria nas etapas anteriores. Mas pau-de-arara é um negócio meio complicado. No Rio e em São Paulo gostavam mais de usar o pau-de-arara do que em Minas Gerais. Mas a gente usava, sim. O pau-de-arara não é vantagem. Primeiro, porque deixa marca. Depois, porque é trabalhoso. Tem de montar a estrutura. Em terceiro, é necessário tomar conta do indivíduo porque ele pode passar mal. Também tinha o afogamento. Você mete o preso dentro da água e tira. Quando ele vai respirar, coloca dentro de novo, e vai por aí afora. É como um caldo, como se faz na piscina. Era eficiente. Mas eu não gostava. Achava que o risco era muito alto. Afogamento não era a minha praia (risos). A geladeira, uma câmara fria em que se coloca o preso, não funcionava em Belo Horizonte. Era muito caro. O que tinha era o trivial caseiro. O menu mineiro.


Aos 53 anos, o engenheiro mecânico José Antônio Gonçalves Duarte, ex-militante do Partido Operário Comunista, POC, lembra com clareza seu suplício: "Esse pulha do Marcelo me torturou durante 98 dias. Era choque nos dedos, ouvidos e órgãos genitais, e afogamento. Há seis anos, eu o vi em São Paulo. Pensei: 'Como é fácil matar esse cara'. Minha mulher me puxou pelo braço e fomos embora". Fotos: Egberto Nogueira


Veja — O que mais tinha no menu mineiro?


Araújo — A dança da lata eu praticava muito.


Veja — Como era?


Araújo — Eu pegava duas latinhas de ervilha e abria. Depois, colocava o cara de pé, em cima.


Veja — Sangrava?


Araújo — Não. Ele falava antes disso (gargalhadas). Mas quem era mais leve agüentava mais tempo.


Veja — E quem não tinha o que dizer?


Araújo — Ia para a lata igual. Mas é muito fácil identificar quem tinha e quem não tinha o que falar.


Veja — Como?


Araújo — Militante é diferente. Jornalista é diferente de militar, que é diferente de empresário, que é diferente de militante. Ele se deixa trair por uma série de coisas. O linguajar, para começar, é diferente. Então, inocente só era torturado quando o agente era muito cru, sem conhecimento algum da práxis marxista, ou quando era um sádico. É muito fácil identificar uma pessoa que não é de esquerda. Vou dar um exemplo. Há algum tempo fui comprar dólares no Banespa, no câmbio turismo. Como até hoje tenho minha carteira militar, apresentei-a no lugar da identidade. O atendente viu a carteira, olhou para mim e perguntou:


— O senhor serviu no colégio militar?


— Tive uma época lá. Por quê? Você foi aluno lá?


— Não.


— Você foi soldado?


— Não.


— Escuta, eu te prendi?


— Não foi bem assim. Fui preso e o senhor foi o único que acreditou em mim. Apanhei com palmatória antes de o senhor chegar e me liberar.


— Sorte, hein? Já pensou se fosse o contrário? (risos).


Veja — O senhor já reencontrou alguma pessoa que torturou?


Araújo — Sim. Eventualmente, eu encontro ex-presos meus, inclusive os que apanharam. E o relacionamento não é muito ruim, não. Não é aquele negócio de dar beijinhos e abraços. Mas é um relacionamento de respeito. Há pouco tempo, aqui em Belo Horizonte, encontrei o Lamartine Sacramento Filho, que é professor em uma faculdade local. Segurei ele no ombro e disse: 'Você não me conhece, não?' Ele levou um susto. Aí eu disse: 'Você tá bom?' Ele disse que sim e não quis mais conversa. Mas também não passa batido, não (risos). Não deixo passar batido (sério).


Veja — Por quê?


Araújo — É o meu esquema. Não deixo passar batido. Não vai passar batido. Não passa batido. Vou lá, coloco a mão no ombro dele e digo: Não me esqueci de você, não. Você lembra de mim? Estamos aí. A vida continua.


Veja — Quantas pessoas o senhor já torturou?


Araújo — Não tenho idéia. Não sou igual a matador que faz talho na coronha do revólver para cada um que mata. Mas você quer um número aproximado?


Veja — Sim.


Araújo — Uns trinta.


Veja — O senhor matou alguém em sessões de tortura?


Araújo — Não. Já atirei, mas não matei.


Veja — Mas morreu gente onde o senhor servia.


Araújo — Pouca gente. O João Lucas Alves, que era um ex-sargento da FAB, foi um deles. Ele morreu na tortura.


Veja — O senhor participou?


Araújo — Não. Isso foi alguns dias antes de eu ser convocado. Depois que eu saí, se morreu alguém eu não sei.


Veja — O que é besteira e o que é verdade no que já se escreveu sobre tortura no Brasil?


Araújo — Há algumas pequenas inverdades. Mas a maioria dos fatos é correta. Há pouca besteira e muita verdade. As pessoas que participaram desse período até hoje não falaram abertamente. As altas autoridades do país foram as primeiras a tirar o seu da reta. Morri de rir ao ler o livro sobre o Geisel (refere-se ao livro que reúne as memórias do ex-presidente Ernesto Geisel, publicado no ano passado pela Fundação Getúlio Vargas). Segundo o depoimento de Geisel, ele não sabia de nada, mandava apurar tudo, era um inocente. É uma gracinha isso tudo. Todos os agentes do governo que escreveram sobre a época do regime militar foram muito comedidos. Farisaicos, até. Não sabiam de nada, eram santos, achavam a tortura um absurdo. Quem assinou o AI-5? Não fui eu. Ao suspender garantias constitucionais, permitiu-se tudo o que aconteceu nos porões. É claro que havia diversas pessoas envolvidas nisso. Mas eu não vou citar o nome de ninguém. Falo apenas de mim.


José Adão Pinto, que pertencia à Corrente Revolucionária, um braço mineiro da ALN, hoje é dono de uma livraria em São Paulo, tem 51 anos, casado, sem filhos: ele ficou estéril devido às intermináveis sessões de choque nos órgãos genitais e sofre de hemorróidas, pois lhe introduziam um cabo de vassoura no ânus. "Todo mundo me torturava, e não apenas o Marcelo, pois eu era o único negro"


Veja — Por que o senhor deixou o Exército?


Araújo — Estava numa encruzilhada. Ou eu ia para a academia ou tomava outro rumo na vida. Preferi terminar o meu curso de direito.


Veja — A tortura não é uma coisa desumana?


Araújo — (Silêncio)


Veja — Quem tortura age como um monstro?


Araújo — Monstro? (em tom indignado). Não. As pessoas que transitam em determinado meio tendem a se relacionar com seus pares. Então, militar andava com militar, policial andava com policial. Essas práticas eram normais entre nós. Quem eu achava que era monstro eram os sádicos. Eu mesmo afastei dois sargentos. Não queria sádicos trabalhando comigo.


Veja — O senhor tem medo de alguma vingança?


Araújo — Não. Andei armado de 1973 até 1980. Tinha um Smith & Wesson, calibre 38, de cinco tiros. Hoje não uso mais arma. Minha preocupação era a violência. Achava que tinha obrigação de reagir à violência. Aí descobri que ia armar bandido. Se for para andar armado, vou atirar pelo menos duas vezes por semana, não vou andar no volante, enfim, há uma série de precauções que precisam ser tomadas.


Veja — O senhor não tem medo de que aconteça algo para suas filhas?


Araújo — Uma das minhas meninas estuda direito na PUC. Há um ano, um débil mental falou para toda a sala que o pai dela tinha sido do Doi-Codi, que torturava gente, esse tipo de coisa.


Veja — Ela já sabia do seu passado?


Araújo — Sim. Quando uma tinha 13 anos e a outra 14, contei tudo. Foi na época em que saiu o livro Brasil: Nunca Mais. O meu nome está lá, na segunda página, para todo mundo ver (risos). É engraçado. Todo mundo tem o livro, mas pouquíssima gente leu.


Veja — Foi difícil essa conversa?


Araújo — Não foi muito difícil, não. Sou um bom pai. Minhas filhas foram bem criadas. Conhecem o pai que têm. Eu nunca escondi as coisas. Nunca disse a elas que fui um santinho. Disse a elas que não pensassem que eu não bati em alguém. Bati, sim. Elas ficaram um pouco chocadas e disseram: 'Pai, já sabemos, mas agora pára'. Não queriam detalhes. Eu segui a minha vida. Não adianta esconder esse tipo de coisa. A verdade uma hora vem à tona.


Veja — O senhor sofreu algum tipo de crise de consciência em função da tortura?


Araújo — Isso sempre deixa dramas na gente. É uma coisa pesada. Não é bom tratar um semelhante dessa forma. Você não quer aproveitar e comer um biscoitinho? (Ele come um biscoito.) Depois de deixar o Exército, tive uma grande crise de depressão. Fiz análise durante sete anos. Mas não foi por isso. Tinha problemas existenciais que não podem ser relacionados com a minha atividade no porão. Tinha problemas na empresa. Queria fazer coisas e o pessoal não queria. Foi problema profissional. Tinha um salário muito bom e ele piorou demais. E dinheiro é uma desgraça. É bom quando não faz falta.


Veja — O senhor se arrepende de ter torturado?


Araújo — Não me arrependo. Mas se você me perguntar se eu faria de novo, é outra conversa. É como você me perguntar se eu gostaria de voltar a ter 21 anos hoje. Com a experiência e o dinheiro que tenho atualmente, quero (risos). Mas não me arrependo de nada do que fiz.


Veja — O senhor faria tudo outra vez?


Araújo — Se achasse que não havia outro caminho para livrar o país do comunismo, sim. Mas, em princípio, não. Porque a tortura ou, eufemisticamente, o interrogatório por meios violentos, que não precisa necessariamente ser a porrada, causa um desgaste muito grande. Nunca me neguei a torturar alguém, porém só fazia quando havia necessidade. Mas a brincadeirinha não tem a menor graça, viu (risos).


Veja — Por que o senhor fazia isso, então?


Araújo — O índice de aproveitamento é de mais de 90%. A primeira vez que vi um interrogatório, como assistente, fiquei chocado. E olha que não tinha agressão. Foi só interrogatório policial duro.


Veja — O que o deixou chocado?


Araújo — A forma como o interrogado desmontou sem apanhar. Não adianta fazer interrogatório sem saber quem é o sujeito, de onde veio e o que faz. Era bobagem pegar um sujeito que foi flagrado com um folheto que se imaginava ser da ala vermelha do PCBR ou do PC do B. Isso não levava a lugar algum. Sabe o que funcionava demais? Um tapa com força na mesa. O cara levava um susto. E falava. Quando vi esse interrogatório, fiquei com pena do sujeito. Eram cinco pessoas em volta dele, gritando, ameaçando, chamando-o de mentiroso. Achava que o cara era inocente. Perdi a pena quando ele abriu o bico. Aí eu disse: "Ah, seu sem-vergonha, quer dizer que isso funciona". Com o tempo, vi outros interrogatórios mais duros. Em seguida, passei a atuar como agente.


Veja — Por que o senhor participou disso tudo?


Araújo — Eu achava que havia a necessidade de destruir as organizações de esquerda do país. Era uma convicção íntima. Nunca gostei do marxismo. Sempre fui visceralmente antimarxista. Isso é uma questão de formação. Meu pai sempre foi antimarxista. A coisa complicou quando descobri que o método (a tortura) era rápido. Bastava levar para o porão e pronto. Mas raríssimas vezes deixei de começar um interrogatório conversando com o indivíduo. Não vou dizer que no calor da prisão o cara não tenha ido direto para o porão. Já aconteceu, sim. Mas foram poucas vezes. Por que sabem o meu nome completo? Porque eu nunca escondi o meu nome. Tinha convicção quanto ao que estava fazendo. Eu não tinha codinome, como quase todo mundo. Portanto, não sou o maior torturador do país, mas sim um dos poucos que agiram de cara limpa.


Veja — Hoje, quase três décadas depois, o senhor não faz nenhuma ressalva ao passado?


Araújo — É preciso admitir que os resultados foram pífios. Atacamos muito a subversão e pouco a corrupção. A única coisa que o Geisel falou em seu livro que eu lhe dou razão é que não se pode fazer um movimento apenas contra. Tem de ser a favor de algo. Faltava isso no movimento. Houve outros equívocos. Para acabar com as lideranças de esquerda, acabaram com as de direita também. Cercearam o movimento estudantil, a política partidária. Foi uma pena. A gente podia ter aproveitado para fazer uma grande remodelação do país. Recentemente, lendo as memórias do Oswaldo Aranha, vi que ele diz o mesmo da Revolução de 1930. Tinha-se de aproveitar aquele período discricionário rapidamente, para impor com agilidade as reformas necessárias. Eu concordo inteiramente com ele.


Veja — Por que o senhor só resolveu dar esse depoimento agora?


Araújo — Porque ninguém me havia perguntado sobre isso antes.

domingo, 30 de janeiro de 2022

POR MOISE MUGENYI KABAGAMBE * Comunidade Congolesa no BRASIL/ Rio de Janeiro/RJ

POR MOISE MUGENYI KABAGAMBE



 Nota de repúdio ao brutal espancamento e morte de um cidadão congolês e refugiado, no Kiosque Tropicália, Posto 8 Barra da Tijuca

Comunidade Congolesa no BRASIL/ Rio de Janeiro/RJ


A Comunidade Congolesa no Rio de Janeiro vem a público manifestar o seu mais veemente repúdio à morte por espancamento de MOISE MUGENYI KABAGAMBE, cidadão Congolês e refugiado de 24 anos, por gerente e seus amigos no KIOSQUE TROPICALIA, Posto 8 Barra da Tijuca, no dia 24 de Janeiro de 2022 às 21h.

MOISE MUGENYI KABAGAMBE foi espancado até a morte no kiosque Tropicália onde trabalhava como ajudante de cozinha por um contrato temporária diária, ao qual foi negligenciado por ter chamado bombeiro somente 40 minutos após da morte e conduzido em IML como desconhecido e informar a família no outro dia em torno de10h.


Segundo relatos e vídeos, MOISE no final do seu trabalho foi pedir seu pagamento diária ao gerente, pela distância que ele teve que pegar até Madureira onde reside, o gerente começou a lhe agredir juntos com seus amigos, 5 pessoas no total, batendo lhe com Bastão de Baseball.*

*Esse ato brutal, que não somente, manifesta o racismo estrutural da sociedade Brasileiro, mas claramente demonstra a XENOFOBIA dentro das suas formas, contra os estrangeiros, nós da comunidade congolesa não vamos nos calar.


Lembrando aqui a Convenção de GENEBRA de 1949 sobre a proteção das Pessoas, onde o Brasil ratificou juntou aos seus protocolos adicionais que tem aplicações CONSUESTUDINÁRIA, um dos princípios básicos do Direito Humano é a Inviolabilidade Absoluta da Vida e direito Humana, particularmente* *Assassinato, tortura, homicídio..., Por isso exigimos a Justiça para MOISE e que os atores do Crime junto ao dono do estabelecimento, respondam pelo crime!!!!


Combater com firmeza e vencer o racismo, a xenofobia, é uma condição para que o Brasil se torne uma nação justa e democrática.

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SOBRE OS GRITOS DE FORA BOLSONARO NAS RODAS DE SAMBA * André Jamaica / RJ

SOBRE OS GRITOS DE FORA BOLSONARO NAS RODAS DE SAMBA

Texto de André Jamaica / RJ
Foto: Mangueira/G1


" Samba e política não devem se misturar." Quem repete esse palpite infeliz, prova que não sabe o que diz, que está completamente deslocado da concepção e do contexto do samba no Rio de Janeiro.


Aqueles que se dizem sambistas - e incluo neste conceito músicos, público, produtores, donos de casas de samba- têm obrigação de saber que o samba chegou a ser proibido no Rio de Janeiro no século XIX. Só chegamos até aqui porque lá atrás, muita gente se dispôs a resistir, logo, ser sambista sempre foi um ato político. " Desde que o samba é assim"


O sambista que diz que samba e política não devem se misturar nunca ouviu ou não prestou a menor atenção em Zé Keti, Candeia, Martinho da Vila, Beth Carvalho, João Nogueira, Paulo César Pinheiro, Aldir Blanc, só pra citar alguns.


O sambista que diz que samba e política não devem se misturar não faz ideia do que acontece num desfile de escolas de samba, nunca ouviu falar em Silas de Oliveira e Mano Décio da Viola. Não seguiu o “mendingo Joãozinho Beija Flor”.


O atual governo numa de suas primeiras medidas, extinguiu o ministério da cultura, rebaixando o ministério á condição de secretaria, cujo atual secretário é uma pessoa absolutamente desimportante e extremamente limitado intelectualmente, o que nos dá uma justa medida da nenhuma importância que o governo dá a esse setor. Por isso estão gritando FORA BOLSONARO! nas rodas de samba.


O atual governo chamou sambistas da importância de Nei Lopes e Martinho da Vila de escória maldita. Por isso estão gritando FORA BOLSONARO! nas rodas de samba.


O atual governo disse que a Fundação Palmares não teria nenhum centavo pra macumbeiro. O que nos dá uma boa noção do que esse governo pensa sobre sambistas históricas como Tia Ciata e Clara Nunes. Por isso estão gritando FORA BOLSONARO! nas rodas de samba.


O atual governo excluiu da lista de personalidades negras, por ideologia, nomes como Elza Soares, Gilberto Gil e Martinho da Vila. Por isso estão gritando FORA BOLSONARO! nas rodas de samba.


O atual governo não lamentou as mortes dos sambistas Aldir Blanc, Beth Carvalho, Elza Soares ( a voz do milênio, a maior cantora da história desse país, a Rainha da porra toda), Monarco, Nelson Sargento mas arrumou tempo pra lamentar a morte de um tal MC Reaça. Por isso estão gritando FORA BOLSONARO! nas rodas de samba.


E não me causa espanto que aqueles que dizem que samba e política não devem se misturar, queiram que a gente aguente calados a todos esses ataques, expondo suas vísceras ditatoriais e seus analfabetismos funcionais sobre o samba. Por isso estão gritando:


FORA BOLSONARO!

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BOLSONARISTA ASSASSINO AMEAÇA A ANVISA * Priscila Tessuto

FASCISTA ASSASSINO AMEAÇA A ANVISA

A cara do fascismo brasileiro no assassinato do cachorro em ameaça à Anvisa

Priscila Tessuto*

A fragilidade da democracia brasileira está patente, seja na facilidade em se legitimar um impeachment, seja no poder dos discursos do presidente da república que ameaça, abertamente, as instituições e os profissionais que fazem o país continuar funcionando. O que o veganismo tem a ver com isso?

Qualquer pessoa vegana que seja responsável por crianças já se deparou com a questão da vacinação. Os que, como eu, assumem esses cuidados a partir do parto, sabem que a criança não sai da instituição – hospital ou casa de parto – sem vacinas: BCG ID e a vacina contra Hepatite B são aplicadas no primeiro dia de vida. Depois, o calendário do SUS acompanha quase mês a mês o desenvolvimento do primeiro ano da criança, com vacinas: DTP, Hib2, VOP, VORH, SRC, dentre outras, em duas, três doses e reforços. Ainda durante a infância, não se matricula a criança em creche ou escola infantil sem o cartão de vacinação em dia. Ou seja, é uma lógica do Estado para zelar pela população humana e nunca houve grandes questionamentos desse padrão.

A dificuldade enfrentada pelas pessoas veganas está na consciência que têm de todo o processo da vacina até ela estar pronta para os humanos: animais de diversas espécies são expostos a doenças e experimentações para que a vacina tenha comprovação de eficácia e segurança entre humanos. Esse processo, para aqueles que buscam a compreensão e a desconstrução do especismo, é penoso e violento. Aceitar o pacto social, o compromisso coletivo do controle e da erradicação de doenças entre humanos às custas de vidas inocentes e descartáveis, é viver uma contradição ética desconcertante.

Por mais que nosso desejo seja o de avançar no debate sobre as vacinas e buscar progredir nos testes, evitando sofrimento e morte de milhares de coelhos, ratos, cães, primatas etc., nos deparamos com uma realidade cuja produção de doenças caminha lado a lado com o crescimento – e a ideia arcaica de progresso – de indústrias alimentícias, farmacêuticas e outras cujos lucros dependem do confinamento e da exploração de corpos não humanos. A COVID-19 é um vírus que, como outros vírus e bactérias igualmente agressivos e letais, é oriundo do confinamento de porcos e aves criados para alimento. Outras tantas doenças têm suas origens no mesmo contexto: aglomeração de espécies exploradas pelo ser humano, para diferentes fins. Mas parece, infelizmente, que não estamos preparados para essa conversa. Ainda nos debatemos na cultura antropocêntrica, pautada pela lógica do capital, tentando sobreviver aos vermes do eugenismo que insistem em contaminar nossa humanidade. E que, sim, detêm as mesmas raízes ideológicas que condenam as demais espécies.

O bolsonarismo é o escancaramento do furor de uma parte significativa da população brasileira que se sentiu ultrajada em compartilhar, cada vez mais, os direitos civis – que avançavam significativamente – por meio da democratização dos direitos sociais. Incluir o pobre no orçamento, como diz o presidente Lula, foi uma ofensa para aqueles que lucravam, material ou simbolicamente, e/ou se confortavam sobre a opressão de corpos alheios. A crença na meritocracia, calcada pela ideia de democratização racial, como se todos os brasileiros partissem da mesma realidade em busca do sucesso, sofreu um xeque quando o estudante da onerosa escola católica perdeu a vaga na universidade federal para o jovem da escola pública da periferia. A presença de corpos pobres, pretos e femininos questiona a eficácia do Homem como figura única do fazer história; a presença de indígenas nos debates políticos questiona a ideia de progresso cultivada desde a colonização e carimbada em nossa bandeira, que virou escudo para aqueles que têm saudades da violência como instrumento “educacional” – controle, obediência e adestramento.

Bolsonaro foi eleito democraticamente sem precisar mentir sobre suas intenções e as percepções da população brasileira. Ainda em campanha, sugeriu metralhar membros do partido opositor, garantiu a retirada de terras indígenas, comprovou a cultura do estupro, inferiorizou mulheres e pessoas negras, em entrevistas, congressos e assembleias. Em seu mandato, incentiva e facilita o porte de armas, questiona e desmantela as instituições, leva metade do país à insegurança alimentar – não os que tem armas! Em meio à pandemia, desmotiva a vacinação com falsidades ideológicas.

Seus eleitores começam a desconfiar da vacina, questionando sua origem, composição e objetivos, fantasiando possibilidades comunista-imperialistas num paradoxo cuja análise renderia um longo estudo (considerando a cultura hegemônica vinda dos EUA, país por eles tão admirado, em um patriotismo esquisito que mora aqui e louva o de lá. Mas seguimos). A resistência à vacinação e a descrença nas instituições fervilharam quando chegou a vez das crianças na fila da injeção. Até então, nunca tinha havido preocupação sobre a composição das vacinas e seu laboratório de origem, ou interesse no nome daqueles que as liberaram para aplicação em nossas crias. As dúvidas provocadas não têm pertinência nem mesmo como interesses reais em compreender o processo – seja da vacina ou do mercado.

A preocupação com as crianças está para além das crianças… Elas carregam para o futuro a ânsia de quem está preso no passado. Da escola sem partido à mamadeira de piroca, as crianças são utilizadas como instrumentos de ataque aos direitos sociais quando o questionamento do status quo começa a aparecer nas instituições escolares que, na lógica do sistema, deveriam formar cidadãos focados no “ser alguém na vida”, mantendo a estrutura social nas opressões privadas dos lares cristãos, onde a mulher tem uma função social, o prazer é pecado e o pai, louvado. A educação sexual e a provocação para uma percepção crítica da realidade são condenáveis nessa manutenção, e o ódio ao que não é espelho faz parte da construção do sujeito, que tem espaço, comportamento e ideologia bem delineados pela estrutura social e cultural do país. A ponte recém-construída sob o abismo entre classe e cor é desmantelada com o dinheiro público e suas partes arremessadas contra quem insiste em reforçá-la.

“Bolsonarista que matou cão em ameaça à Anvisa tem 17 anos e faz parte de grupo nazista no RS” [1]

Um jovem menor de idade que, por lei, não responde por seus atos, ameaça profissionais da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que trabalham pela saúde pública lutando contra os discursos coercitivos do presidente da república. Um cachorro, ainda que considerado propriedade, tem direitos de proteção e bem-estar protegidos por lei. Mas é torturado e assassinado em tempo real, ações registradas no vídeo-ameaça: “É isso que vai acontecer com vocês”. Esse é um grupo social que encontrou espaço seguro para se denominar neonazista! Trata-se de uma lógica eugenista, de superioridade de raças, num país que caminhava para a compreensão da dívida histórica para com os cidadãos não brancos que ergueram, e ainda sustentam, esta nação.

O cachorro, julgado inferior por sua condição não humana, ainda possui algum direito garantido na escala especista eletiva, onde cada espécie recebe um tratamento de acordo com os interesses humanos. Ao porco, a facada ainda é considerada legal perante a lei; ao boi, o tiro de pressão na testa; à vaca, a inseminação forçada e o afastamento de sua cria, já condenada. Mas cães e gatos escaparam do direito humano de matar. Filmar o assassinato de um cachorro é gerar provas contra um crime, e a crueldade causou espanto por parte dos que acessaram o conteúdo do vídeo. Outra parte, dos que – arrisco dizer – são eleitores de Bolsonaro, justificaram: “é só um cachorro”.

“É só um cachorro”, para esta vegana que vos escreve, lembra o poema “A indiferença”, de Bertold Brecht. Talvez os que ainda estão moralmente presos no antropocentrismo se ofendam: afinal, o dramaturgo se limita às referências humanas. Mas quem exercita a desconstrução do especismo sabe que quem filma a morte e a tortura de um animal é capaz de fazer o mesmo com seu semelhante, porque a pessoa não se vê mais no outro, não há empatia, não há semelhança. Há uma prática de coisificação da vida, presa na lógica de Descartes de que os gritos dos animais são como os rugidos da carroça.

O cachorro, aqui, pode ser bem representado pelo referente ausente conceituado na obra de Carol Adams, A política sexual da carne: um corpo utilizado para um fim que ignora o sujeito que sente, sabe que sente e não pode resistir. A autora associa essa violência com os corpos das mulheres abusadas sexualmente que, em comentários comuns entre elas, referem-se a si mesmas como carnes de açougue: “Me senti como um pedaço de carne”. Um pedaço de carne não representa o sujeito daquele corpo; um pedaço de carne não faz mais parte de um corpo morto de um sujeito ignorado. Um pedaço de carne não sente. É possível se aproximar daquela ideia de outrora, que se referia ao corpo do trabalhador se tornando uma máquina, cujos movimentos repetitivos, nas longas jornadas de trabalho, acabava compondo o próprio maquinário que acionava. Em muitos momentos da história, o ser humano pôde sentir-se como um pedaço de carne, ou um pedaço de máquina, que não sente: um sujeito inexistente.

O acontecido, com o jovem e seu cachorro, tem tantas camadas de violência e violação que este artigo se limita a um convite para a reflexão sobre as estruturas e hierarquias de poder. É exatamente no exercício de enxergar essas camadas que lutamos pela vida das pessoas e de todos os animais.

*PRISCILA TESSUTO é atriz, psicopedagoga, ativista vegana, mãe. Licencianda em Ciências Sociais e arte educadora.

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sábado, 29 de janeiro de 2022

DEVOLVAM MEU DOUTOR * Tatiana Bruscky/PE

 DEVOLVAM MEU DOUTOR

ONDE ANDARÁ O MEU DOUTOR?


Hoje , acordei sentindo uma dorzinha...

Aquela dor sem explicação e uma palpitação!

Resolvi procurar um doutor...

Fui divagando pelo caminho...

Lembrei daquele médico que me atendia vestido de branco e que para mim, tinha um pouco de pai, de amigo e de anjo...

Meu doutor...que curava a minha dor!

Não apenas a do meu corpo, mas a da minha alma...ao me transmitir paz e calma!

Chegando à recepção do consultório, fui atendida com uma pergunta:

- "Qual o seu plano?"

Meu plano?!?..

Ahhh! meu plano...é viver mais e feliz!

É dar sorrisos, aquecer os que sentem frio e preencher o vazio que sinto agora!

Mas, a resposta teria que ser outra!

"Meu plano de saúde"...

Apresentei o documento do dito cujo, já meio suado tanto quanto o meu bolso e...aguardei...

Quando fui chamada, corri apressada....ia ser atendida pelo doutor.

Ele que cura qualquer tipo de dor!

Entrei e o olhei... Me surpreendi...

Rosto trancado, triste e cansado.

"Será que ele estava adoentado?

É, quem sabe, talvez gripado!"

Não tinha um semblante alegre, provavelmente devido a febre...

Dei um sorriso meio de lado e um bom dia!

Olhei o ambiente bem decorado.

Sobre a mesa à sua frente um computador

e no seu semblante a sua dor...

O que fizeram com o doutor?

Foi quando ouvi a sua voz de repente:

- "O que a senhora sente?"

Como eu gostaria de saber o que ele estava sentindo...

Parecia mais doente do que eu a paciente...

" Eu? Ah! Sinto uma dorzinha na barriga e uma palpitação"

e esperei a sua reação.

Vai me examinar, escutar a minha voz

e auscultar o meu coração.

Para a minha surpresa apenas me entregou uma requisição e disse:

- "Peça autorização desses exames para conseguir a realização..."

Quando li quase morri...

"Tomografia computadorizada",

"Ressonância magnética"

e "Cintilografia"!

Ai meu Deus! Que agonia!!!

Eu só conhecia uma tal de "abreugrafia"...

Só sabia o que era "ressonar" (dormir),

de "magnético" eu conhecia um olhar...

e "cintilar" só o das estrelas!

Estaria eu a beira da morte?

De ir para o céu?

Iria morrer assim ao léu?

Naquele instante timidamente pensei em falar:

"Não terá o senhor uma amostra grátis de calor

humano para aquecer esse meu frio?

O que fazer com essa sensação de vazio? Me observe doutor!

O tal "Pai da Medicina", o grego Hipócrates acreditava que,

"A ARTE DA MEDICINA ESTÁ EM OBSERVAR".

Olhe pra mim...

É bem verdade que o juramento dele está ultrapassado!

Médico não é sacerdote...

Tem família e todos os problemas inerentes ao ser humano...

Mas, por favor me olhe! Ouça a minha história!

Preciso que o senhor me escute e ausculte!

Me examine!

Estou sentindo falta de dizer até "aquele 33"!

Não me abandone assim de uma vez!

Procure os sinais da minha doença e cultive a minha esperança!

Alimente a minha mente e o meu coração...

Me dê ao menos uma explicação!

O senhor não se informou se eu ando descalça... Ando sim!

Gosto de pisar na areia e seguir em frente

deixando as minhas pegadas pelas estradas da vida,

estarei errada?

Ou estarei com o verme do amarelão?

Existirá umas gotinhas de solução?

Será que já existe vacina contra o tédio?

Ou não terá remédio?

Que falta o senhor me faz, meu antigo doutor!

Cadê o Scott, aquele da emulsão?

Que tinha um gosto horrível

mas me deixava a que nem um "Sansão"!

E o elixir? Paregórico e categórico!

E o chazinho de cidreira,

que me deixava a sorrir sem tonteiras?

Será que pensei asneiras?

Ahhh! Meu querido e adoentado doutor!

Sinto saudade...

Dos seus ouvidos para me escutar.

Das suas mãos para me examinar...

Do seu olhar compreensivo e amigo...

Do seu pensar..

Do seu sorriso que aliviava a minha dor...

Que me dava forças para lutar contra a doença...

E que estimulava a minha saúde e a minha crença...

Sairei daqui para um ataúde?

Preciso viver e ter saúde!

Por favor me ajude!

Ohhh! Meu Deus, cuide do meu médico e de mim,

caso contrário chegaremos ao fim...

Porque da consulta só restou

uma requisição digitada em um computador

e o olhar vago e cansado do doutor!

Precisamos urgente dos nossos médicos amigos...

A medicina agoniza...

Ouço até os seus gemidos...

Por favor! Tragam de volta o meu doutor!

Estamos todos doentes e sentindo dor! E Peço!!!


PARA O SER HUMANO UMA RECEITA DE "CALOR"

E PARA O EXERCÍCIO DA MEDICINA UMA PRESCRIÇÃO "AMOR" !!

*ONDE ANDARÁ MEU DOUTOR?*


Tatiana Bruscky/PE

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