quinta-feira, 21 de julho de 2022

CAMPANHA DO PLENO EMPREGO * J. Carlos de Assis

 CAMPANHA DO PLENO EMPREGO

J. Carlos de Assis

Desde o fim da União Soviética, ficou obsoleta, de um ponto de vista realista, a proposta centenária da classe trabalhadora de expropriar os meios de produção capitalista como condição para a melhora de suas condições de cidadania. Entretanto, se a experiência soviética esgotou-se, não significa que os trabalhadores não possam levantar uma bandeira de luta alternativa, tão poderosa, em termos ideológicos, como foi a luta pelo socialismo no século XIX e início do século XX.

Para mim, essa proposta alternativa é a luta pelo Pleno Emprego. Trata-se de um objetivo intermediário entre o capitalismo selvagem e o comunismo ideal, mas irrealizável na prática. Contudo, ela só poderia mobilizar as massas se viesse como proposta política das próprias classes trabalhadoras. Caso surgisse apenas no plano intelectual, seria vista com suspeição, ou uma espécie de rendição ao Capital, que sairia como o grande vitorioso no conflito social.

A luta pelo Pleno Emprego, colocada como prioridade dos trabalhadores, tem um aspecto político muito favorável. Ela concilia os interesses das classes tradicionalmente adversárias – ou inimigas, quando se radicaliza no capitalismo -, em torno de um interesse comum. O trabalhador precisa de emprego (ou de ocupação dignamente remunerada) para sobrevier, enquanto o empresário precisa de trabalhadores para mover seus meios de produção. Sem isso, a sociedade fracassa.

No plano filosófico, um pensador alemão da virada do século XVIII para o XIX, Johann Fichte, deixou isso de forma bem clara: se a propriedade privada é considerada um dos fundamentos da democracia moderna, é preciso que a sociedade dê resposta à questão fundamental de promover emprego para os que não têm propriedade. Foi pensando nisso, provavelmente, que Karl Marx lançou as bases de “O Capital”. Sua solução, porém, foi na linha radical:  a expropriação dos meios de produção privados. 

Em termos contemporâneos, um programa de Pleno Emprego poderia ser a base de um grande pacto social que mobilizaria trabalhadores e patrões. Mas teria que apoiar-se em iniciativas concretas, de que tratarei oportunamente. Por enquanto, vou adiantar que estamos discutindo com lideranças sindicais e comunitárias um Programa de Emprego Garantido/Trabalho Aplicado, inspirado num programa indiano, que poderia ser estruturado neste ano para aplicação pelo próximo governo.

Não creio que possa haver resistências políticas ao PEG. Pode haver, sim, resistências pelo lado fiscal, porque sempre haverá quem ache que o programa seria caro demais. Na Índia existe esse tipo de resistência, mas tornou-se irrelevante diante das inequívocas vantagens do programa, iniciado por um governo progressista e continuado por um conservador.  Contudo, nenhuma iniciativa pública deveria ser avaliada devido a seu custo bruto. São seus efeitos sociais que devem ser avaliados.

 O PEG que vamos propor, se por um lado vai garantir emprego pago pelo Estado a desempregados em determinadas condições, por outro lado vai aplicar essa mão de obra na produção de bens e serviços de interesse da própria sociedade, reduzindo as terríveis tensões sociais que hoje prevalecem em nossas metrópoles devido ao alto desemprego. A ideia geral é que esses bens e serviços sejam direcionados para as próprias periferias, onde se concentra o desemprego.

Para que o PEG seja implementado no contexto da política de Pleno Emprego, é fundamental que os dirigentes sindicais se entendam entre si sobre sua viabilidade. Em   seguida, convém que submetam o tema ao empresariado progressista. De fato, é uma proposta que pode ser levada aos mais altos níveis da representação do trabalho, inclusive da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pois ninguém poderá dizer que este fórum, que reúne trabalhadores e patrões, seja contra o pleno emprego.

Há, contudo, uma advertência que deve ser feita: o Pleno Emprego não deve ser entendido apenas como plataforma ideológica. Terá que funcionar na prática. No caso brasileiro, e sobretudo em nossas metrópoles, o desemprego elevado está se tornando motivo de degradação social irreversível. Os empresários estão enfrentando uma classe trabalhadora desorganizada pelas reformas neoliberais. Não precisam temê-la. Mas, talvez, no fim, terão de entregar suas propriedades às massas enfurecidas no meio da entropia social, como começa a acontecer em São Paulo.  


P.S. A campanha pelo pleno emprego foi lançada em junho no contexto do “acerto de contas com o neoliberalismo”, através de uma live/vídeo que vem sendo retransmitida pelo youtube. Nas próximas semanas, precedendo cada live/vídeo, sairá um artigo meu ou de outros economistas progressistas, no Monitor Mercantil, relacionado com a campanha. 

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