Vou seguir expondo a minha indignação e minha vergonha, como militante e sindicalista antigo, com o que vem acontecendo. Mas gostaria de deixar bem claro que não estou me referindo a qualquer partido político. Meu dedo está apontado para o peito dos atuais dirigentes sindicais, muitos dos quais jamais participaram de um grande movimento de massas, nunca enfrentaram a ditadura, nunca sofreram com a repressão e nem estavam em “listas negras” que corriam nas fábricas, nunca participaram de piquetes que viravam dias e noites. Caíram nos atuais cargos de “dirigentes” como paraquedistas.
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Então, só para lembrar, vou fazer um breve relato:
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1894 - em Santos, no 1° de Maio, o Centro Socialista realiza palestra e debate. Alguns autores consideram a primeira comemoração da data, no Brasil.
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1900 - em 25/09, fundado em São José do Rio Pardo (SP) o Clube Democrático Socialista Os Filhos do Trabalho. O manifesto do Clube para o 1° de maio de1901 foi escrito pelo socialista Euclides da Cunha que dizia ser necessária “a reabilitação do proletariado, pela exata distribuição da justiça, cuja fórmula suprema consiste em dar a cada um o que cada um merece, abolindo-se os privilégios quer de nascimento, quer de fortuna, quer da força.”
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1906 - o 1° de maio foi comemorado em várias cidades. Em São Paulo, o Sindicato dos Gráficos uniu-se a outros sindicatos para realizar apresentações teatrais, em vários teatros da cidade. No Rio de Janeiro houve comemoração em praça pública. Em Santos houve comemoração, mesmo com uma violenta repressão enviada pelo governo (navios de guerra ancoraram no porto para intimidar). Em Campinas, surgiu o primeiro número do jornal A Voz Operária.
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1907 - o 1° de maio foi comemorado em todas as grandes cidades brasileiras e marca o início da luta pela jornada de 8 horas em nosso país.
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1909 - o número 10 do jornal A Voz do Trabalhador (1° de maio de 1909) publicava, pela primeira vez no Brasil, a letra do hino A INTERNACIONAL, composto por Pierre Degeyter e Eugène Pottier, em 1871, e que já virara o hino das comemorações do 1° de maio na Europa (junto com a bandeira vermelha usada pelos operários de Paris).
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1929 - Em 1° de Maio é criada a Confederação Geral dos Trabalhadores que, em março do ano seguinte, promove um Congresso de Agricultores e inicia a fundação de Sindicatos Rurais.
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É a partir dos primeiros anos da década de 40 que o governo passa a assumir as comemorações do 1° de maio e a transformar o dia de luta (pela jornada de 8 horas diárias de trabalho e de outras resistências para os trabalhadores) em festas com futebol de graça, shows com artistas e bailes para desviar o sentido das comemorações. O “Dia Internacional de Luta da Classe Trabalhadora” passou a ser usado para iludir o próprio trabalhador.
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1968 – Já na ditadura militar, no 1º de maio, estudantes e trabalhadores se unem para organizar o Dia do Trabalhador. O Governador de São Paulo, Abreu Sodré, alimentava o sonho de suceder Costa e Silva e resolve se promover, autorizando o ato e mandando construir um palanque. Ao chegar à praça, com sua comitiva, é recebido com pedradas e palavras de ordem contra a ditadura, fugindo do local. Os manifestantes queimam o palanque oficial e saem em passeatas pelas ruas da capital.
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1981 - A bomba do Riocentro - A comemoração do 1° de maio, organizada pelo Centro Brasil Democrático (Cebrade), seria realizada no pavilhão do Riocentro. Cerca de 20.000 pessoas já se encontravam no local e aplaudiam um show da Elba Ramalho, quando todo o local foi sacudido por uma explosão. No estacionamento do pavilhão, perto da casa de força do Riocentro, uma bomba explodiu dentro de um carro Puma com dois oficiais do exército. O caso, até hoje, não tem explicação, e os ministros militares anunciaram, na época, que os militares é que teriam sido alvos de um atentado.
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Um 1° de Maio marcante Quando os metalúrgicos do ABC (São Paulo) entram em greve, em abril de 1980, o movimento já tinha algo de diferente, antes mesmo de começar. O adesivo que convocava para a Assembleia era claro: "Chegou a hora! Vamos matar nossa sede." Por seu lado, o governo anunciava sua determinação de reprimir e lembrava que o sindicato já sofrera intervenção em 1979. A Assembleia do dia 30 de março, um domingo, votou pela greve. O movimento começou, e todos sabiam que seria longo e difícil. Um "Comitê de Solidariedade" foi criado e contava com setores da Igreja católica, associações de moradores e setores da esquerda. No dia 17 de abril, às 18:30 h, o Ministro assina o decreto, determinando a intervenção no Sindicato e afastando a diretoria. No dia seguinte, helicópteros do exército sobrevoavam São Bernardo, enquanto tropas da Polícia Militar, com carros "brucutus" e policiais da temida ROTA (polícia do Estado de São Paulo) cercavam o Sindicato. Do outro lado, o movimento ia crescendo e conquistando todo o descontentamento popular contra o regime. A Associação Brasileira de Imprensa, a Ordem dos Advogados do Brasil, a Comissão de Justiça e Paz e centenas de outras entidades e organizações passam a apoiar e mostrar adesão a uma greve iniciada pelos peões do ABC. O 1° de Maio foi comemorado em São Bernardo (eu estive lá) por lideranças de todo o país, mesmo com a sede do Sindicato fechada e sob intervenção. A greve continuava!
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Uma bomba no Memorial No dia 1° de maio de 1989, em Volta Redonda (Rio de Janeiro), os metalúrgicos da Companhia Siderúrgica Nacional - CSN - inauguraram o Memorial projetado por Oscar Niemeyer em homenagem aos três metalúrgicos assassinados pelo exército durante a greve de novembro (09/11/1988). A Central Única dos Trabalhadores - CUT - havia indicado a cidade de Volta Redonda como a sede da comemoração oficial do 1° de maio, e caravanas de trabalhadores chegavam dos Estados próximos para a homenagem. A inauguração do Memorial foi presenciada por cerca de 20 mil trabalhadores que lotaram a praça e as ruas próximas. Na madrugada seguinte, dia 02, por volta das três horas, Volta Redonda acordou com o Barulho de uma explosão... Na praça, centenas de pessoas atraídas pelo barulho olhavam para o Memorial tombado por duas bombas de alto poder explosivo!
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Minha vergonha é ver toda essa história se transformando em um “bingo do trabalhador” ou eu um show musical. Neste Primeiro de Maio vou ficar em casa, talvez chorando por tudo isso.
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